sexta-feira, julho 29, 2011

O filósofo da contracultura

Hebert Marcuse é um dos mais importantes filósofos da chamada Escola de Frankfurt. E também um dos que mais se distanciaram do pensamento apocalíptico que caracterizou essa escola. Enquanto Adorno chamava a polícia para reprimir os jovens revoltosos de 1968, na Alemanha, Marcuse era o líder intelectual da garotada que pretendia fazer uma revolução baseada em princípios de liberdade e beleza. A influência de Marcuse na década de 60 era tão grande que se dizia que a juventude seguia três Ms: Marx, Mao, Marcuse.

A crítica à racionalidade técnica irá direcionar toda a sua obra. Para ele, a instrumentalidade das coisas tornava-se a instrumentalidade dos indivíduos. Em outras palavras, o ser humano era visto como uma coisa, como um instrumento, e não como um indivíduo. Ao invés do homem dominar a máquina e tecnologia, como previa a utopia iluminista, era o homem que estava sendo dominado pela máquina e pela tecnologia. As pessoas são transformadas em coisas, reproduzidas em seqüência, massificadas, como produtos saindo de uma linha de montagem.

Marcuse denunciou a criação do chamado homem unidimensional: um indivíduo que consegue ver apenas a aparência das coisas, nunca indo até a sua essência. O homem unidimensional é conformista, consumista e acrítico. Ele se acha feliz porque a mídia lhe diz que ele é feliz e, quando se sente triste, vai ao shopping, fazer compras.

Para Marcuse, as mudanças só ocorreriam se houvesse a liberação de uma nova dimensão humana. Um princípio básico deveria permear essa nova revolução: a liberdade.

A nova sociedade, que surgiria das ruínas da sociedade consumista, deveria ter uma dimensão estético-erótica e, no lugar do consumismo, do conformismo, da competição, surgiriam os valores da felicidade, da paz e da beleza.

À pergunta de Adorno "É possível fazer poesia depois de Auschwitz?", Marcuse vai responder positivamente. A arte ainda é possível, desde que seja uma arte revolucionária, que denuncie a sociedade unidimensional e leve aos receptores os novos valores. Curiosamente, Marcuse vai encontrar justamente em um produto da Indústria Cultural, tanto criticada pela Escola de Frankfurt, um exemplo dessa arte revolucionária: as músicas de Bob Dylan.

Segundo o filósofo, "A arte só pode cumprir sua função revolucionária se ela não fizer parte de nenhum sistema, inclusive o sistema revolucionário". O artista deve não consolar, mas instigar o seu público e fazê-lo rever seus valores. A trajetória de Bob Dylan demonstra bem isso. Quando achou que seu público estava acostumado com suas músicas políticas, ele lançou um disco não político.

No campo dos quadrinhos, o melhor exemplo talvez seja o roteirista britânico Alan Moore. Suas histórias sempre apresentaram uma dimensão crítica, seja do sistema (em V de Vingança), seja da potencialidade destrutiva da ciência, representada pela bomba atômica (em Watchmen e Miracleman). Quando seus fãs se acostumaram com seu trabalho mais intelectualizado, ele passou a fazer histórias de super-heróis para a editora Image.

Assim, para Marcuse, a nova arte não seria uma peça de museu, mas algo vivo, a expressão de um novo tipo de homem. Em alguns momentos, a recusa da obra de arte poderia ser uma forma de fazer arte.

Esse pensamento influenciou o movimento da contracultura, com seus fanzines, revistas alternativas e rádios livres. Outra conseqüência foi a anti-arte, um movimento que, em sua versão mais branda, procura demonstrar o equívoco da arte como ornamento, como peça de museu. Um exemplo disso foi o barquinho pirata colocado pelo estudante de jornalismo Cleiton Campos no meio de obras famosas durante a última Bienal. O quadro de Cleiton não tinha qualquer valor artístico, mas valor de atitude. Colocar em dúvida o aspecto sacramental da arte pode, também, ser um tipo de arte. 


PS: Este texto foi publicado originalmente no Digestivo Cultural. Publico hoje em homenagem aos 32 anos da morte de Marcuse, morto no dia 29 de julho de 1979. 

1 comentário:

Rodrigo Santos de Souza disse...

por algum motivo foi o filósofo que menos nos foi apresentado no curso de publicidade e propaganda.